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Desvendando Raízes: Desafios no Acesso à Cultura e História Africana e Afro-brasileira nas Escolas de Ensino Básico do Brasil
Falta de conscientização sobre identidade racial e limitado envolvimento em atividades culturais expõem problemáticas no ensino de cultura e história afro-brasileira
Escrito por Nathaly Shige
15:46 - 16 de Abril de 2024

Foto: freepik.com
Mariana, aluna do Ensino Médio, se vê diante de uma pergunta aparentemente simples durante uma pesquisa em sua escola: "Qual é a sua raça ou cor?" Sua resposta é um sincero "Marrom, mas meio claro; não sei ao certo." Mariana não está sozinha na falta de nitidez sobre sua identidade étnica e racial. Essa confusão inocente ecoa uma realidade inquietante que permeia boa parte das escolas brasileiras – com consequências para os dados que informam debates públicos sobre desigualdades na escola e fora dela, bem como para o desenho de políticas que buscam endereçar essas desigualdades.
A falta de clareza e compreensão sobre a própria identidade racial reflete não apenas a ausência de diálogo aberto sobre a diversidade, mas também aponta para lacunas mais amplas no ensino de cultura e história afro-brasileira. A problemática rompe as paredes das instituições de ensino e educação, integrando-se em diversas esferas da sociedade brasileira.
De acordo com pesquisa realizada pelo Equidade.info entre junho e julho de 2023 que contou com participação de escolas representativas do ensino básico nos estados do Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte e Pará, dados revelam que 9,7% de estudantes pretos (classificados pela escola no preenchimento do censo escolar) e 6,8% daqueles classificados pela escola como pardos responderam "Não sei" ou "Não entendi" quando questionados sobre sua raça. Esse índice é ainda maior no Ensino Fundamental, onde um terço dos alunos designados pela escola como pretos ou pardos não sabem responder essa pergunta. Ainda, cerca de 35% dos alunos indígenas dos anos iniciais do Ensino Fundamental I não conseguem se auto-declarar sem que haja o estímulo por meio de alternativas nas perguntas sobre raça ou cor. Esses dados sugerem que uma quantidade expressiva de estudantes não possuem uma compreensão sólida da sua própria identidade, indicando uma lacuna relevante no ensino e no debate sobre identidade étnica e racial no país.
Embora a maioria dos grupos raciais de estudantes tenha tido exposição a conteúdos sobre cultura africana e afro-brasileira por meio de vídeos ou filmes (52% entre os estudantes que se autodeclaram brancos ou amarelos, 66% entre aqueles autodeclarados pretos , 60% entre pardos e indígenas, e 48% entre aqueles que preferem não declarar raça ou cor), a participação em atividades culturais específicas, como teatro, música e contação de histórias, varia significativamente entre os grupos segundo a pesquisa. Os números indicam que a exposição direta a esse tipo de manifestações culturais é menor entre os alunos pretos (36%) e aqueles que optam por não declarar raça ou cor (0%).
A grande maioria dos estudantes (72%) teve experiência com a exposição do conteúdo em sala de aula, sendo essa sua principal fonte de aprendizado, independentemente da etnia. Esse dado destaca a relevância que escolas e professores desempenham para que haja acesso igualitário à informação e aprendizagem da cultura africana e afro-brasileira.
Apesar de serem a fonte principal de conhecimento acerca da temática, dados revelam que gestores de escolas do ensino básico atualmente enfrentam desafios na implementação do tópico no currículo educacional. Uma parcela significativa, 26% destes, indica que o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira não está na agenda prioritária da escola. A falta de informação e orientação também é destacada por 30% dos respondentes. Ainda, a ausência de apoio de outros entes e/ou instituições, mencionada por 38% dos gestores, sugere a ausência de envolvimento da comunidade e articulação com órgãos governamentais e não governamentais.
Imaginemos um cenário em que as escolas, gestores, professores conseguissem superar esses desafios. Mariana, a estudante mencionada no início deste texto, compreenderia melhor a sua própria identidade na sociedade ao receber uma educação cultural inclusiva, bem como a importância da diversidade cultural e histórica ao seu redor. Investir na educação étnica e racial não é apenas uma responsabilidade educacional, mas uma medida vital para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. Ao moldar perspectivas desde a infância, abrimos caminho para um futuro onde Mariana e todos os estudantes brasileiros tenham a chance de entender e valorizar plenamente a riqueza cultural que o seu país apresenta.
*Atenção: todos os nomes e personagens retratados nesta produção são fictícios. Nenhuma identificação com pessoas reais (vivas ou falecidas) é intencional ou deve ser inferida.