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A Percepção dos Estudantes de Ensino Médio Sobre Dinâmicas de Classes Sociais no Brasil
Uma pesquisa inédita do Equidade.info revela que quase ⅔ dos estudantes de Ensino Médio consideram que uma classe social só pode se tornar mais próspera às custas das demais
Escrito por Felipe Soares
31 de Janeiro de 2025

Foto: Beto Monteiro / Secom UnB
A desigualdade social no Brasil está entre as mais altas do mundo — em 2022, o Brasil tinha o segundo índice de Gini mais alto entre os países para os quais o Banco Mundial conseguiu atualizar o indicador naquele ano. Essa desigualdade está profundamente enraizada no contexto histórico brasileiro, marcado pela exploração do trabalho escravo desde a chegada dos colonizadores. Mesmo após a abolição da escravidão, a população negra e indígena continuou enfrentando formas persistentes de opressão, agravadas pela ausência de políticas públicas capazes de garantir educação de qualidade, e condições dignas de moradia, acesso ao mercado de trabalho e participação cidadã efetiva.
Desigualdades persistentes tendem a promover tensões sociais, especialmente quando baseadas na ideia de que a sociedade é um "jogo de soma zero" – ou seja, que melhorar as condições materiais de alguns grupos só é possível às custas de piorar as condições dos demais. Embora essa ideia não seja necessariamente verdadeira (em um contexto em que o país cresça gerando benefícios para todos os grupos), ela pode refletir a realidade de um país que cresce com desigualdade, com as elites capturando a maior parte dos ganhos de crescimento.
Diante desse cenário, compreender as percepções dos estudantes brasileiros sobre a natureza das desigualdades sociais – e, em particular, se a sociedade é um "jogo de soma zero" – é fundamental. Hoje, conheceremos a história de Amanda, uma jovem negra e estudante da 1ª série do Ensino Médio. Amanda cresceu acompanhando sua mãe, que trabalha como empregada doméstica, em visitas às casas dos patrões. Desde cedo, testemunhou de perto as diferenças marcantes entre sua realidade e a dos empregadores de sua mãe. Apesar de sua vivência pessoal com a desigualdade social, a falta de debates sobre o tema na escola dificulta que Amanda desenvolva uma opinião crítica e bem fundamentada.
Em que medida as tensões sociais decorrentes das desigualdades no país são internalizadas já na idade escolar? E será que o sistema educacional brasileiro promove, de fato, uma educação crítica sobre essas questões?
Para tentar responder a essas perguntas, o Equidade.info conduziu uma pesquisa em 17 estados brasileiros – Acre, Amapá, Pará, Rondônia, Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina – entre dezembro de 2023 e março de 2024. O objetivo era compreender as opiniões de estudantes do Ensino Médio sobre a seguinte afirmação: “No Brasil, existem muitas classes sociais diferentes. Se uma classe se torna mais rica, isso geralmente ocorre às custas de outras classes.”
Os resultados, baseados numa amostra representativa do Ensino Básico brasileiro, documentam que 65,2% dos estudantes do país concordam que a sociedade brasileira é um ‘jogo de soma zero’. Apenas 18,5% discordam; 10,1% não têm opinião formada e 6,1% não sabem responder.
O pessimismo quanto à capacidade de conciliar os ganhos sociais entre diferentes grupos é mais elevado entre as meninas (69,4% contra 61,1%; entre os meninos, o nível de discordância é quase o dobro do observado entre as meninas: 24,2% contra 12,5%).
O percentual de estudantes que enxergam a sociedade como um "jogo de soma zero" aumenta à medida que avançam no Ensino Médio. Na 1ª série, apenas 33,7% concordam com essa visão, mas esse número sobe para 61,1% na 2ª série e atinge 77,3% na 3ª série. Esse padrão sugere que a escola, de alguma forma, fomenta o pensamento crítico.
Se o percentual de concordância é semelhante entre escolas públicas e privadas (65,4% vs. 63%), as diferenças aparecem na proporção que vê a possibilidade de avanços sociais para todos os grupos: se esse percentual é de 18,1% nas escolas públicas, chega a 22,8% nas escolas privadas.
75% dos estudantes brancos concordam com a afirmação, em contraste com 61,7% dos estudantes negros e apenas 29,2% dos indígenas. Esses dados sugerem um possível déficit na maneira como a educação aborda questões históricas e sociais que impactam diretamente estudantes negros e indígenas. Essa lacuna pode contribuir para a falta de opinião crítica ou clareza sobre o tema.
Os resultados levantam mais dúvidas do que certezas. Pesquisas mais aprofundadas são necessárias para compreender os avanços e os desafios de incluir esses debates na educação brasileira, considerando as experiências históricas e pessoais de grupos historicamente marginalizados, além das dinâmicas sociais que poderiam modificar o contrato social de exclusão intergeracional.
Somente por meio de uma educação crítica e sensível é que estudantes como Amanda poderão não apenas compreender e as desigualdades que os afetam, mas também contribuir com soluções para superá-las.
*Atenção: Todos os nomes e personagens retratados nesta produção são fictícios. Nenhuma identificação com pessoas reais (vivas ou falecidas) é intencional ou deve ser inferida.